Ela estava só, mas não infeliz. E ela sabia exatamente que solidão não era infelicidade, só dependia de como as pessoas tratavam a solidão. E ela, a tratava muito bem, digamos de passagem. Há alguns anos, ela leu uma frase de Guimarães Rosa que dizia ‘infelicidade é apenas uma questão de prefixo’, depois disso, ela nunca mais esqueceu o que era prefixo, muito menos que o prefixo ‘in’ significa ‘não’, e que ‘não’ era um termo que ela não gostava de muito utilizar.
Existem palavras que ela não gostava de pronunciar, muito menos de escrever, porque era na escrita que ela se encontrava verdadeiramente. E um dos últimos pedidos dela, é que eu não perdesse o meu tempo escrevendo essas palavras. Uma vez, quando estávamos sentadas na varanda da minha casa ela me disse ‘existem palavras que não deveriam existir’, e hoje, como estou sem ela, concordo com o que ela disse.
Ás vezes, sinto que ela está bem próxima de mim ainda. Quando essas palavras chegam até... como vocês dizem mesmo? Ah é ‘na ponta da língua’. Então quando essas palavras chegam ‘na ponta da língua’, ela me vem na memória, e todas as suas frases sobre não falar palavras ‘feias’ passam como um flashback. Ai eu desisto de falar aquela palavra e procuro algum sinônimo menos trágico, no meu pouco conhecimento lingüístico.
É um pouco estranho falar dela assim, em terceira pessoa, às vezes eu me sinto tão ela. Como se eu a tivesse matado, e por isso esteja eternamente ligada a ela. Não sei se éramos alma gêmea, pra dizer a verdade, só acreditava nisso quando ela estava perto, mas ela nunca mais vai estar. Então não vejo nenhum problema em deixar de acreditar em algumas coisas que só ela me fazia acreditar, talvez assim seja fácil esquecê-la.
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